antes do céu e outros poemas de Leonardo Bachiega
Robbrez
Outra canção
o peso
do mundo
é o amor*
que humano ser
mais do que o que imaginamos
fazer o que carregamos
o cotidiano
sob o fardo
da insatisfação*
o
amor
soletra a procura
o bicho cansado
das metrópoles
ao passar os anos
e
um corpo
fuligem de outro corpo
se encostam
assim mostrando
o tanto...
a não sumirem
deste lugar
contemplando
fantásticas fábricas
o
último desejo
é o amor*
recolhe-se
a medida
certa para cada qual
o seu
a sintaxe sincera
essa frase que
corre dentro dos nossos
lumes
quando
estamos às
cidades airosas
deve
dar-se
sem nada de volta*
o bom presente inesperado
a receber
aquele sinal sagrado
da lembrança
a não mencionada lida
que tanto se aprecia
escrever palavras
em
papeis mascados
o amor
hóspede que não nos
tranca às latarias
e
o mesmo não reluta
a realidade
a mudança da sala antiga
a sensação
de estar a salvo
mergulhado a um
manto animal
que
e querer
desejar
buscar
estar
eu
sempre quis
voltar
ao corpo
em que nasci*
e
voltar à apaixonada
ficção
é o amor*
que humano ser
mais do que o que imaginamos
fazer o que carregamos
o cotidiano
sob o fardo
da insatisfação*
soletra a procura
o bicho cansado
das metrópoles
ao passar os anos
e
um corpo
fuligem de outro corpo
se encostam
o tanto...
deste lugar
contemplando
fantásticas fábricas
é o amor*
a medida
certa para cada qual
o seu
a sintaxe sincera
essa frase que
corre dentro dos nossos
lumes
quando
estamos às
cidades airosas
sem nada de volta*
a receber
aquele sinal sagrado
da lembrança
que tanto se aprecia
escrever palavras
em
papeis mascados
hóspede que não nos
tranca às latarias
e
o mesmo não reluta
a realidade
a mudança da sala antiga
a sensação
de estar a salvo
manto animal
que
desejar
buscar
estar
voltar
ao corpo
em que nasci*
voltar à apaixonada
ficção
*em itálico, sampler
do poema “Canção” de Allen Ginsberg, tradução de Cláudio Willer.
eu e manoel de barros rabiscando caramujos
falava que os vazios são maiores e até infinitos*
e por isso ele aprendeu... a sua lâmpada
a só luzir depois do espaço do seu oco
*sampler do
poema “O menino que carregava água da peneira”, de Manoel de Barros
2.
no mundo real
é assim que foram feitas (todas as coisas) –
sem nome*
quando quiser sugerir algo aponte a sua impressão
não deixe a imagem morrer ocre sobre a cidade
é assim que foram feitas (todas as coisas) –
sem nome*
quando quiser sugerir algo aponte a sua impressão
não deixe a imagem morrer ocre sobre a cidade
*sampler
do poema “Prefácio”, de Manoel de Barros
3.
eu ando sozinho tateando com a mente a alegria
não é fácil saltar de uma sobre outra estrela
mas é sobre esses caminhos de pedras humildes
que às vezes me deito
eu não saio de dentro de mim nem para pescar*
por isso minha noite flui como lonjuras viventes
não é fácil saltar de uma sobre outra estrela
mas é sobre esses caminhos de pedras humildes
que às vezes me deito
eu não saio de dentro de mim nem para pescar*
por isso minha noite flui como lonjuras viventes
*sampler
do poema “O livro sobre o nada”, de Manoel de Barros
antes do céu
1.
queria ser o texto
que se apaga
ninguém poderia traduzir-me
seria a moça
a dobar pássaros
2.
a moça
queria acompanhar-me
por onde fosse
como um rouxinol no coração do ar
como se enxugar o tempo
fosse adivinhar a saudade
3.
estamos eu e ela
resolvendo a paisagem
até libertarmos os olhos da solidão
e ao desenhar solidão líquida no espelho
esperar o breu
4.
o sentido da palavra amor
eu sorver-te a lágrima enquanto choras
perco-te quando está triste
se anda com dificuldade
até onde descem os ossos
eu demoraria o seu peso
5.
a moça envolta a entulhos
vedou os olhos com estuque para escapar do mundo
eu inteiro num molde disse
quando o teu anjo chegar... eu estarei bem
com a boca cheia de campainhas
procurando por todo o lugar uma alma
se eu disser fico...
o frio será o meu mate
6.
eu não consegui parar a árvore
e ela seguiu andando para o meio do mato
descobri depois
tatear teu rosto
é como uma árvore centenária
na mata
7.
eu replico ilhas inalcançáveis
procuro o segredo do amor
e da verdadeira vida
a moça com um fino tear
tece fios de aves na palavra
homem
8.
eu não habito a terra
habito uma janela demorada
ela estava na janela
ouvindo pensamentos
9.
você com as tuas raízes limpa o mar
você com a tua dentição de lua
soletra o céu
como eu poderia respirar amor contido
debaixo de um mármore
a moça guardando uma fiada de afogados
fez-me a chuva esquecer a remota morte
10.
a moça ainda separando um amor do outro
disse
o coração rosna a mais pequena ameaça
o que não fica pede-se
beber ao poço um sentimento alheio
a costurar cinzas e sombra
11.
eu ao colocar a mão sobre a dela
cuidadosamente como se em carne viva
olhei para a página
para que o poema não a perseguisse
ela simples como faz
desapareceu para sempre
eu... cumpri parado o olhar
como um lagarto que adorna o sol
esperando um sopro de luz me fechar
que se apaga
ninguém poderia traduzir-me
seria a moça
a dobar pássaros
queria acompanhar-me
por onde fosse
como um rouxinol no coração do ar
como se enxugar o tempo
fosse adivinhar a saudade
resolvendo a paisagem
até libertarmos os olhos da solidão
e ao desenhar solidão líquida no espelho
esperar o breu
eu sorver-te a lágrima enquanto choras
perco-te quando está triste
se anda com dificuldade
até onde descem os ossos
eu demoraria o seu peso
vedou os olhos com estuque para escapar do mundo
eu inteiro num molde disse
quando o teu anjo chegar... eu estarei bem
com a boca cheia de campainhas
procurando por todo o lugar uma alma
se eu disser fico...
o frio será o meu mate
e ela seguiu andando para o meio do mato
descobri depois
tatear teu rosto
é como uma árvore centenária
na mata
procuro o segredo do amor
e da verdadeira vida
a moça com um fino tear
tece fios de aves na palavra
homem
habito uma janela demorada
ouvindo pensamentos
você com a tua dentição de lua
soletra o céu
como eu poderia respirar amor contido
debaixo de um mármore
fez-me a chuva esquecer a remota morte
disse
o coração rosna a mais pequena ameaça
o que não fica pede-se
beber ao poço um sentimento alheio
a costurar cinzas e sombra
cuidadosamente como se em carne viva
olhei para a página
para que o poema não a perseguisse
ela simples como faz
desapareceu para sempre
eu... cumpri parado o olhar
como um lagarto que adorna o sol
esperando um sopro de luz me fechar
caia cada qual desfeita
naquela
época não tinha deus para nos fazer estampar a demasiada custa dos nossos
momentos... falávamos no ouvido palavras obscenas. caminhar não era uma
premissa a noite estava por descobrir um vulcão extinto um sopro. Iludíamo-nos
para que não nos sobrasse mais nada era difícil para nós decidirmos por nossos ídolos
talvez o luar nu a brevíssima graça a sensível miragem.
a nudez turvava-nos de um linho negro nos olhos tínhamos a madrugada para descobrir o que era olhar com as mãos sempre em palavras umedecidas. não era mais possível recusar as tuas luas o mundo para nós despertou-se com seus diversos venenos
uma a
uma
dedilhávamo-nos
a beber e descrevíamo-nos como se nossos olhos fossem duas jarras de cristais.
escrevo apenas um pedaço de ti a parte que a chuva ainda não tomou para si.
éramos
uma só cidade repleta de vida de noturnos corpos de alguma etiópia esculpida.
deitávamos em inteiras tribos. éramos a insuportável essência de um único
lugar.
era
simples desejar ficar com as cartas da noite
depois
o prazer da companhia é tão fácil como se tomássemos café com amigos próximos.
isto porque não nos restava mais nada.
a nudez turvava-nos de um linho negro nos olhos tínhamos a madrugada para descobrir o que era olhar com as mãos sempre em palavras umedecidas. não era mais possível recusar as tuas luas o mundo para nós despertou-se com seus diversos venenos
isto porque não nos restava mais nada.
adonis cristalizando seres
palavra é a cama de voz
voz é o filme que mistura o rosto do óxido e do deserto
deserto é tristeza feliz
feliz é a lida cansada da ave
ave é transcrição múltipla da chuva
chuva é a serenidade de uma vida
vida é o cesto ecrã com uma mancha cuja essa mancha celebra
busca
sobre o autor:
Leonardo Bachiega, é arquiteto, urbanista e escritor, nascido em São Paulo, hoje reside na cidade de Carapicuíba. É autor de alguns livros de poesia e um de dramaturgia e possui poemas publicados em diversas revistas literárias do Brasil e Portugal e também possui poemas em diversas antologias, entre elas a antologia da off flip. Fernando Pessoa é o seu poeta da vida.
Instagram: @lbachiegaVariações: revista de literatura contemporânea
VIII Edição - Vozes que não
param de gritar
param de gritar
Edição de Marcos Samuel Costa
2022
Comentários
Postar um comentário