BABAÇU LÂMINA - POEMAS | Demetrios Galvão, Fernando Abreu & Franck Santos

ÀS VEZES, ENCONTRO MORTES DE OUTRAS VIDAS

os dias sopram um vendaval afoito

batida de metais pesados

em terreno insensato

trovoada de escárnios banindo existências

sangue gratuito regando nascentes

resíduos de chumbo, mercúrio, arsênio

as árvores da cidade choram os suicídios juvenis

os rios paralisam suas agitações aquáticas

velhos assombros visitam o presente

nessa terra devastada

um gutural crossover se eleva

na direção de uma esperança qualquer

– viver é palavra que se afirma com luta.

Demetrios Galvão |Teresina/Piauí/Brasil|. Poeta, editor e professor. Autor dos livros de poemas Fractais Semióticos (2005), Insólito (2011), Bifurcações (2014), O Avesso da Lâmpada (2017), Reabitar (2019) e do objeto poético Capsular (2015). Em 2005 lançou o CD de poemas Um Pandemônio Léxico no Arquipélago Parabólico. Participou do coletivo poético Academia Onírica e foi um dos editores do blog Poesia Tarja Preta (2010-2012) e da AO-Revista (2011-2012). Edita a revista Acrobata.

PARA MARIO GOMES

dizem que você se ferrou

entrou para a lista

dos ex-famosos que agora

precisam trabalhar para sobreviver

vendendo água de coco na praia

sanduíche natural no leblon

ou transportando velhinhas em uma van

não sei em qual destas atividades

você foi flagrado como um criminoso,

nu, como um bandido de toga

pouco importou dizer

que está mais tranquilo agora

com seu trabalho ao ar livre

desapegado dos flashes da fama

as pessoas preferem a piedade sádica

que estaria plenamente satisfeita

se você estivesse magro além do normal

e morando na rua,

ainda que temporariamente

só até uma emissora de tv

especialista em sonegação e golpes políticos

demonstrar grandeza lhe oferecendo

um papel de quinta num programa de segunda

gosto de pensar que você recusaria

simplesmente viraria as costas para eles

pelas gargalhadas das velhinhas

pelo potássio e pelas fibras da tenra

carne dos cocos

pelo pão sírio e pelo espírito do atum

nadando contra a corrente

e as contra redes ferozes da Thai Union

como todo mundo deveria fazer

mas não faz.

Fernando Abreu |São Luís/Maranhão/Brasil|. Poeta e letrista. Atuou por cerca de dez anos como editor da revista de poemas Uns & Outros, em trabalho coletivo com membros da Akademia dos Párias (movimento de agitação literária/cultural do MA nas décadas de 80 e 90). É o autor dos livros de poemas Aliado Involuntário (Exodus, 2011), O Umbigo do Mudo (Clara Editora, 2003), Relatos do Escambau (Exodus, 1998) e Manual de Pintura Rupestre (7 Letras, 2015). Tem poemas publicados nas revistas Germina, Modo de Usar, Sibila, Poesia Sempre e no Blog do Antonio Cicero. Mantém o blog Homem Comum.

PEQUENO MAPA HISTÓRICO/GEOGRÁFICO DE UM TURISTA QUASE ACIDENTAL NA ESPANHA

Eu tenho medo de que chegue a hora

Em que eu precise entrar no avião

Belchior

Tenho 39 motivos para ir à Espanha:

Almodóvar. Ibiza. Madri. Tortilha. Paelha. Sangria. Picasso. Salvador Dalí. Goya. Miró. Mariza Mallo. Lita Cabellut. Lorca. Cervantes. Bunuel. Penépole Cruz. Gael Garcia Bernal. Pilar Miró. Antonio Banderas. Córboda. Salamanca. Sevilha. Rick Martin. Shakira. Julieta Venegas. Manu Chao. Andrea Bocelli. Plácido Domingo. Museu do Prado. Málaga. Ilhas Canárias. Caminho de Santiago. Catalunha. Cava. Maiorca. Castelo de Butrón. Barcelona. As touradas (para protestar). O barbeiro de Sevilha.

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Tenho um motivo para não ir à Espanha:

Medo de avião (Se ao menos tivesse um comissário de voo solidário para segurar a minha mão/

onda/

fobia.

Franck Santos |São Luís/Maranhão/Brasil|. Poeta, editor, bancário e geógrafo. Possui especialização em educação ambiental. Filho do interior do Maranhão, tem cinco livros publicados entre poemas, prosa e romance. Seus trabalhos mais recentes são https://www.editorapenalux.com.br/.../os-mapas-sinalizam... e Os blues que não dançamos (Moinhos, 2020).