O CLIMA QUENTE DO MERCADÃO ─ FICÇÃO DE MARCIEL CORDEIRO
O
clima quente do Mercadão
Gosto de ficar debaixo do Mercadão sempre tomando uma cerveja gelada e observando os transeuntes. Odeio ficar andando pelas ruas escaldantes. O calor de Teixeira de Freitas é uma espécie de purgatório, mas creio que há algo de especial ─, você anda uns vinte minutos e sua cabeça começa a doer e o suor já molhou todo o seu rego. E parece que ficamos eufóricos, velozes. Algo do tipo.
Fiquei tomando minha
cerveja e em alerta para fugir dos vendedores que sempre nos abordam com algum
papo sobre família e no fim acaba nos convencendo a comprar. No bar havia um
mototaxista pagando cerveja para uma moça e se achando o cara mais esperto. Mas
só que aí surge uma mulher baixinha que chega enfiando o braço para cima do
mototaxista, ele se esquivava, mas a baixinha era rápida com os golpes, ele
deixou o capacete sobre o balcão e a mulher apanhou-o e desferiu alguns golpes
na mulher que bebia com o rapaz. Passei a mão na minha gelada e fui me
afastando do bar. Fiquei uns dois metros de distância da briga. Depois a mulher
foi perdendo energia e começou a proferir palavras baixas e o mototaxista
revidava com mais baixeza. Deu para entender que aquilo era expressão do amor.
Existem os efeitos colaterais do amor. Não é que eu defenda a violência. Mas
não acredito que amar seja somente ir ao shopping de mãos dadas, ou postar uma
fotografia do casal no instagram feita na praia de Alcobaça. Essas coisas
chatas.
Alguém resolveu ligar
para a polícia. Em questão de poucos minutos dois policiais aparecem no
corredor do mercado municipal, quem não estava envolvido na briga logo resolveu
se esconder e partiram para o interior do banheiro público. Você pode odiar a
polícia por sua prepotência e covardia, mas você irá odiar ainda mais se os policias
forem baianos. O pau come. Também rumei para o interior do banheiro. Não sei se
consigo descrever o quanto o banheiro do mercado municipal de Teixeira de
Freitas é asqueroso, eu diria que é do mesmo naipe daquele banheiro indiano do
filme Quem Quer Ser um Milionário. Fiquei próximo a entrada do banheiro. O
responsável pela limpeza ficava dando voltas com uma vassoura em uma das mãos.
Andava até a porta e voltava para o mictório onde fingia mexer no zíper da
calça e olhava para os homens que estavam mijando. Só um voyeur para suportar
aquele banheiro asqueroso. Uma vez assisti a um filme em que um voyeur
construía túneis em um motel para ficar assistindo aos casais transando.
Existem diversas formas de se buscar o prazer, mas a sociedade tenta nos impor
uma ideia de monogamia onde homem e mulher transam sob um dogma religioso, e
acredito que aquele homem da vassoura buscava fugir disso.
Voltei para o bar assim
como a maioria dos clientes, o mototaxista estava lá com cara de quem perdeu
uma luta de boxe por ponto. A mulher baixinha estava do lado como se fosse uma
capitã. Tomei mais uma cerveja enquanto ouvia as conversas daquelas pessoas.
Olhei para a garota que antes estava bebendo com o mototaxista e pisquei para
ela, que me olhou com uma cara de que me achava feio. Voltei a olhar para a
garota, agora balbuciando um poema do Neruda e tentando seduzi-la, ela
continuou rindo. Então paguei minha cerveja e deixei de me interessar por aquelas pessoas
e saí andando. Fazia uns 35 graus célsius em Teixeira de Freitas e a sensação
deveria ser de quase 50.
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