Obscena paisagem - 05 poemas de Karla Lima
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| (Van Gogh) |
Obscena paisagem
Acordei no frio, garganta arranhando, arranhada
e a cidade acordada,
cinza sólida
cinza insólito,
acrisolada...
Acordei ardendo,
calor,
desejo,
metonímia,
figurativamente concebendo sonhos
desses sem medo,
e frases sem rima.
Na janela
a gata olha a cidade,
no colchão,
no chão,
no vão...
A cidade ruidosa,
a saudade maldosa,
a maldade escandalosa
e a poesia treme, geme, quase goza.
Sobre deitar no tempo e esquecer do chão
Deito a minha pele entre seus lábios,
liquefaço...
No chão,
um céu perde as folhas.
Deixo a minha alma em seu peito,
perco-me em suas mãos,
entre as árvores, nuvens de papel.
Tropeço em melodias,
componho versos,
e volto a me ver,
no chão do tempo entre suas mãos...
Réquiem para o vento
Começamos por email,
Ao meio,
Caixas de entrada vazias,
Mensagens rápidas:
“Como foi seu dia?”
Amor líquido,
Solúvel,
Em tempo real.
Amor tempestuoso,
Volúvel,
Tristeza maquinal.
Pequenos desvelos,
Desfeitos,
Pequenos quereres,
Rejeitos...
Emails, pra cada nova dor
Ora eram os ciúmes,
Em poucos era o amor.
Fazer da dor poesia,
Poético olor,
Acréscimos em amarelo,
Desencontros em griz,
E o vazio maior que a caixa,
E a distância maior que o mundo.
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| (Van Gogh) |
Precisa em se desmanchar
Eu não sou o paliativo
para curar o seu tédio,
não sou o remédio
para suas horas mortas,
nem minha carne
será o regalo
para sua indecisão.
Não lhe quero ao meu lado,
em hora nenhuma.
Preencho-me de uma languidez particular
e não lhe cabe nela
nem em minha vida,
na minha cama
ou sofá.
Nunca lhe coube me caber,
só lhe basta o não ser,
ser indeciso.
Eu só quero o que preciso,
e que é preciso,
Em saber de me querer.
Signos e fados
Te vejo nas palavras,
Mesmo no verso sem rima
Que por sofisma,
Parece o que não é.
Te encontro na poesia,
Ainda que nos desencontremos
Entre signos e fados,
Poemas cansados
E vaticínios inconcretos.
Te dou todos os versos,
Ainda que com censura,
Mas há de achar imensa ternura
No gesto de confiar.
Te desejo nos seus traços
Entre linhas Luz e sombras
Ou no voo que transporta
O beijo de Iemanjá.
(POEMAS PUBLICADOS NO LIVRO "SOBRE DEITAR NO TEMPO E ESQUECER
DO CHÃO", EDITORA PENALUX)
Karla Lima - Foi poeta de gaveta por anos a fio. Vive sua intensidade que transborda nas palavras, que lhe assaltam de tempos em tempos e em dias cinzas ainda mais. É autora do livro “Sobre deitar no tempo e esquecer do chão” publicado pela Editora Penalux em 2020. É uma mulher mutável, sob influência do signo de Câncer, e isso se dilata do seu gosto por viagens aos seus cabelos azuis.
curadoria e edição de marcos samuel costa
variações revista de literatura contemporânea
2020
I edição




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Beleza de poemas. Gostei de todos!
ResponderExcluirGente! Sou fã da Karla Lima! Aproveitem esse e outras deliciosas paisagens da vida em poesia desta MULHER.
ResponderExcluirEncantadora leitura 😍😍
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