ENTREVISTA COM O CINEASTA E ESCRITOR BRAZ CHEDIAK – por Gigio Ferreira

Braz Chediak nasceu em Três Corações em 1 de junho de 1942. É ator, roteirista, cineasta e escritor brasileiro. Filho de Elias José e de Maria Aparecida Guimarães Chediak. Começou sua carreira como ator no filme O Homem que Roubou a Copa do Mundo (1963) de Victor Lima, ao lado de Grande Otelo, Ronald Golias, Herval Rossano e Renata Fronzi.



 por Gigio Ferreira 


GIGIO FERREIRA: Você consegue equilibrar um personagem com o seu poder lírico... Ou durante uma crônica há milhões de motivos?

BRAZ CHEDIAK: A crônica sai em segundos, às vezes de uma frase que, quase sempre, cai fora depois. E sai sem equilíbrio. São apenas frescuras do coração, sem motivo ou alvo.

GIGIO FERREIRA: Como é a sua poesia pelo lado de dentro?

BRAZ CHEDIAK: É como aquele jacaré do Rubem Braga: “... um bêbado ia pela rua e um enorme jacaré ia atrás dele. Cada vez que o homem entrava em um bar o jacaré gritava: bêbado! Quando o homem saía de um bar para entrar em outro, o jacaré gritava outra vez: bêbado! Até que uma hora o homem perdeu a paciência, agarrou o jacaré pelos queixos e o virou pelo avesso, jogando-o a um canto da calçada. Quando saiu do bar o jacaré lhe disse - odabeb! - que é bêbado de trás pra diante”. A resposta não tem nada a ver mas a história do velho Braga é ótima.

GIGIO FERREIRA: Em suas crônicas você é capaz de carregar o sol. Como é então a sua máquina de fazer flores?

BRAZ CHEDIAK: Suas perguntas estão me levando ao Salvador Dalí. Não faço flores - sou um ser imperfeito, desajeitado -, as observo pelas janelas.

GIGIO FERREIRA: A intuição é um milagre?

BRAZ CHEDIAK: Um milagre que é apenas o início de um grande trabalho. É difícil colocar uma palavra depois da outra. E lá vem lembrança literária: Você se recorda de “Os três Mosqueteiros”? Nele, Porthos, o gigante, escora pontes com os ombros, faz milagres com sua força. Na continuação do livro, no romance “30 anos depois”, Porthos vai atravessar uma rua e pensa: “como posso colocar um pé na frente do outro?” e fica paralisado, não consegue andar, é atropelado por uma carruagem e morre. É isso que acontece, quando tentamos por a intuição em ordem. Então é melhor deixar o milagre acontecer e, depois, coloca-lo em ordem. E é uma tortura, cada vez que leio o que escrevo modifico alguma coisa. Neurose?

GIGIO FERREIRA: Quantas vezes o transe foi um aviso ou uma ressonância?

BRAZ CHEDIAK: Todas às vezes foram avisos e ressonâncias. Pode durar segundos ou se perder. Às vezes incomodando, quando Santo baixa errado e a gente deixa de ser médium e passa a ser cambono.

GIGIO FERREIRA: Filmar a vida é controlar a palavra escrita?

BRAZ CHEDIAK: Filmar é dar movimento à palavra escrita. No princípio era o verbo. No princípio é o roteiro. Depois o movimento.

GIGIO FERREIRA: Toda luz é mesa posta?

BRAZ CHEDIAK: No sentido que a mesa posta é sagrada. Mas também é atrito, como quis Vitor Hugo: “Do atrito de duas pedras chispam faíscas; das faíscas vem o fogo; do fogo brota a luz”. Como sou apenas um “artista” provinciano, acho melhor o atrito com um corpo feminino, amado. E no escuro, quase sem luz.

GIGIO FERREIRA: A liberdade consegue atravessar um país em seus últimos dias? Por quê?

BRAZ CHEDIAK: Sim. Quando não conseguir instala-se as trevas. E atenção: estamos tangenciando as trevas, qualquer escorregão...

GIGO FERREIRA: A música é roda? Por quê?

BRAZ CHEDIAK: Porque se movimenta sempre, flui, está em tudo. “O carro de boi já vai gemendo/ lá no estradão/Suas grandes rodas fazendo/ profundas marcas no chão/Vai levantando poeira, poeira vermelha, poeira/Poeira do meu sertão...”. É isso. Música é roda e também é poeira. Algumas entram nos olhos, por isto é bom ter sempre um lenço no bolso, porque a mocinha pode ir embora antes do The End.

GIGIO FERREIRA: A câmera é capaz de escrever? Por quê?

BRAZ CHEDIAK: Acho que um crítico responderia melhor e, cá pra nós, sou péssimo crítico. Para escrever prefiro o teclado.

GIGIO FERREIRA: O que é a realidade? E o que você achou dessa entrevista ao Jornal Crescendo/Revista Variações?

BRAZ CHEDIAK: Estranhíssima. Depois me diga o que os leitores acharam. Se algum gostou, providencie uma internação urgente no manicômio mais próximo. Mas peça que alguém leve, se você for... Não sai mais.





No teatro atuou, em 1962, na peça Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente, sob a direção de Paulo Afonso Grisolli. Escreveu em 1966 seu primeiro roteiro para o filme Na Onda do Iê-Iê-Iê, de Aurélio Teixeira, em parceria com o diretor e Renato Aragão. Os Viciados (1968) é sua primeira realização cinematográfica. Com Aurélio Teixeira, foi responsável pelo argumento e pelo roteiro do filme Mineirinho, Vivo ou Morto (1967). E da adaptação de "O Meu Pé de Laranja Lima" em 1970. Roteirizou todos os filmes que dirigiu: A navalha na carne, Dois perdidos numa noite suja, Bonitinha, mas ordinária, Perdoa-me por me traíres, entre outros tantos. Lançou recentemente o livro de Crônicas (Uma Corruíra na Varanda). Editora Penalux. Tem crônicas publicadas em vários jornais.




Gigio Ferreira nasceu no dia 22 de junho de 1967, em Belém do Pará. Cursou Letras. Sua estreia se deu com a publicação da dramaturgia infantojuvenil, O gringo da Matinta (2014), em parceria com a escritora Miriam Daher, pela Editora Giostri-SP. Com exceção do livro O Palhaço de Arame Farpado (2016), poesia, pela Editora Penalux, as suas oito obras publicadas, foram pela Editora Giostri. Atualmente possui dezoito livros inéditos aguardando publicação.




curadoria e edição de marcos samuel costa
Variações revista de literatura contemporânea
2020
I edição

Comentários


  1. Parabenizo os dois artistas, entrevistador e entrevistado. Excelente entrevista!

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  2. Eu, leitora, gostei. Diria que é uma enquete "entranhíssima". Diz muito de dentro. Ou talvez de afora. E "Não, não é louco. O espírito somente/ É que quebrou-lhe um elo da matéria./ Pensa melhor que vós, pensa mais livre./ Aproxima-se mais à essência etérea." (Junqueira Freire). É isso.

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  3. Perguntas inusitadas e respostas inteligentes.
    Gostei.
    Ambos estão de parabéns.

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