07 poemas de Mica(ela) Tavares

(Célia Aloisio) 

Voo livre

Eu gostava de um livro
de uma poeta
que tinha um poema
que me lembrava o quanto
eu gostava
de ti
quando eu não podia mais
gostar
lancei a poeta
a poesia
e a prosa inteira pela janela
agora
eu pulei da janela
para ver se dá pé
Voei


Fim da bossa



quando eu disser
Baby
as palavras certas
será que d’un coup
tu virás me ofertar
as cores da tropicália
ou eu terei que lamuriar
por mais um dia
na tua batcaverna
ao som do João na vitrola
eu você nós duas
já temos um passado
meu amor


desculpe vir sem avisar


o sol na cabeça
a as linhas atemporais
do livro que leio
me fazem pensar
em te ligar
você na cabeça
e as linhas atemporais
do corpo que anseio
me fazem
tocar a campainha
do teu apartamento
sem avisar


Talvez ela tenha me fisgado


ontem
eu falava bem mais das meninas
as quais não hei de negar
que adoro
quando tão desengonçadas
armam planos
criam fábulas
para me ver
hoje
eu falo bem mais da menina
a qual não hei de negar
que adoro
quando tão arrepiada
sussurra baixo
um segredo
que me faz gaguejar
e me render
qual era o assunto?




I'm bad for you but


I'm bad
tentei te escrever canções
perdi o trecho que dizia
que me acompanharia no
teu ukulele azul
eu pensava em notícias para dar:
o cinema em que íamos fechou
e te vejo tímida ao beijar-me
sob a areia
talvez eles vejam
e não me importo
que vejam
porém, darling, tu te importas
mas tudo bem!
às vezes jogo pedras
na água e faço-as quicar
consegue ver? Talvez não viste pois
atendia o celular
darling, I'm bad for you but
estou disposta a esperar
as cinco horas de trânsito sem sinal
me fazem enlouquecer sem você
por isso
escrevo poemas


Tenho reparado nos ipês pela cidade

o meu corpo
restringe
que tua alma
me queira
pouco me importa
o corpo dos
outros pouco me
interessam fico
de ver se vens
quando vens
vou
abaixo a cabeça
enrubesço
mas volto o olhar
ao teu – de vez em sempre
procuro pelo melô
que dançamos na
mesma intensidade
em que reparo os
ipês floridos
pela cidade: como se
fosse a última coisa a se
fazer antes de
morrer.

Hiperglicêmica


uma vez li que o açúcar em
excesso no sangue pode levar
a uma condição perigosa
Hiperglicêmica
a qual o sujeito se deixa padecer
não sei se a falta dele também padece
porque não li o artigo
inteiro
não li o artigo inteiro porque
o efeito do açúcar no sangue
que eleva as taxas
de exames
e regala os olhos
me levou a pensar que o amor na verdade
é uma inconsistência paralela
de açúcar em excesso no sangue
socialmente aceita


veja bem,

ei de listar alguns efeitos colaterais:

• Náusea;

• Vista embaçada;

• Respiração rápida;

• Fraqueza;

• Tontura;

• Infecções de pele ou feridas que não cicatrizam.

este último justifica por si só o que quero dizer, gente!

feridas que não cicatrizam! É evidente!

o excesso de açúcar no sangue

explica tão bem minhas reações

ao te ver. uns dizem que é exagero – nestes aplico glicose no sangue para verem o que é bom!





Mica(ela) Tavares (20 anos): aquariana com ascendente em peixes – por isso escrevo poemas. Estudante de Direito na UEMA nas horas restantes, leitora apaixonada dos poetas marginais e contemporâneos. Talvez anarquista, um pouco tanto simpatizante comunista, sapatona.




Variações: revista de literatura contempôranea 
III Edição
Curadoria de Franck Santos
Edição de Marcos Samuel Costa
janeiro LGBTQIA+ 
2021


Comentários

  1. PERFEITA 💛 teus poemas são lindos

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  2. Belíssima e incrível a capacidade de ter profundidade em palavras tão rápidas e enunciados tão curtos que de maneira desproporcional ao quantitativo na visão material, transmitem tanto sentimento e conexão com a vida que como um sofro, inspiram a viver! Viver a vida, sem rodeios às feridas que já deveriam haviam de cicatrizar. Mica + poesia = é beleza !

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    1. Que beleza é toda essa sua delicadeza! Obrigada pela leitura delicada!!! ❤️

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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