Natal de luzes no interior - Gutemberg Armando Diniz Guerra

 



Natal de luzes no interior

Gutemberg Armando Diniz Guerra*


Os Guajajara fecharam a BR 316 entre os municípios de Santa Inês e Bom Jardim, no Estado do Maranhão e nós que voltávamos para casa depois de uns dias nos Lençóis maranhenses, procuramos um lugar onde repousar enquanto eles não permitissem aos veículos passarem. Reivindicavam contra o Marco Temporal que o Congresso Nacional insistia em estabelecer contra o previsto na Constituição de 1988, derrubando o veto de Lula a mais essa agressão aos povos originários. Ficamos em um hotel na beira da estrada durante umas duas horas, entre 15 e 17 horas, quando soubemos que poderíamos seguir viagem ainda no claro. O sol se pôs e a decisão foi seguir dirigindo à noite até o nosso destino em Cuiarana.

Em cada cidade às margens da estrada no Estado do Maranhão, víamos as ornamentações em profusão de lâmpadas coloridas, árvores podadas em formas diversas de animais e objetos como estrelas, bolas, barcos, pessoas... As luzes nos ofereciam desenhos de presépios, papais noéis, renas, trenós, árvores de natal em formas de pinheiros. Parques de diversões, lanchonetes, bares e gente nas ruas apreciando a ornamentação nos transportou para comparações com a 5ª Avenida em Nova York ou as vitrines parisienses, em que os comerciantes enfeitam seus estabelecimentos para aguçar o consumo dos seus produtos, com uma associação subliminar entre a festa e o deslumbramento capitalista. Demo-nos conta de como somos desdenhosos dos gestos carinhosos de nossos patrícios administradores, sensíveis ao nascimento do Menino Deus, ou de como sabem utilizar esse fato para lhes dar visibilidade política, que seja, mas o fazem com a singeleza que poderia despertar nossos sentimentos e o turismo para o interior ao invés de levar nossos irmãos para admirar a capacidade de compra e o que se faz no exterior. Viemos curtindo cada ornamentação caprichosamente exposta em espaços públicos, para pessoas como nós, desconhecidos e passageiros, mas cristãos e admiradores da estética proposta tanto quanto os moradores daqueles lugares por onde estávamos passando.

Sem querer entrar no mérito dos elementos estéticos e tecnológicos utilizados para nos encantar nessa viagem semiótica, mas analisando cada ponto que nos despertava interesse, nos chamou a atenção a oferta de informações horizontais e verticais na estrada principalmente no estado do Maranhão. Ainda que faltando algumas, tínhamos indicações dos quilômetros antecedido pelo nome da rodovia, vez em quando placas indicavam-nos os limites de municípios, as distâncias para as principais cidades à frente e um grau de manutenção completamente diferente do que encontramos entre Gurupi e Capanema. Placas ilegíveis se viam por todo o percurso, principalmente à noite, mas a ausência delas por mais de 150 km nos chamou a atenção, além da indigência dos lugarejos e a carente ornamentação, de tal maneira que parecia termos saído de um país e entrado em outro.

Agradecemos aos povos originários que fecharam a estrada durante o dia para nos obrigar a viajar a noite e ver como é bonita a celebração do natal entre populações humildes de um estado rico em manifestações culturais. A gratidão também se estende por nos ter aberto os olhos para o abandono em que vivem e se encontram os que habitam a extremidade do nosso estado do Pará, ou será que os recursos vindos para os municípios não lhes permitem mais um pouco de graça para celebrar a vinda do Menino Jesus?

De qualquer forma, seja no interior do estado, seja em nós mesmos, o que interessa não são os apelos ao consumo, nem ao visual inspirador, nem as grandes celebrações, mas o que seremos capazes de fazer a partir de nós mesmos, silenciosa mas efetivamente a partir das luzes e sentimentos positivos que possamos fazer brotar em nossas mentes e corações.     


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*Engenheiro agrônomo


Comentários

  1. Nosso cronista, tento às questões sociais não deixa, no entanto, passar despercebido o Natal. Viva Gutemberg Armando Diniz Guerra

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