O BOTO TEM UM FILHO TROVADOR em AFUÁ. MINHA RÁPIDA FALA SOBRE JURACI SIQUEIRA na 27ª Feira Pan-Amazônica do livro e das multivozes – Paulo Nunes

 


Jeová Barros


O BOTO TEM UM FILHO TROVADOR em AFUÁ. MINHA RÁPIDA FALA SOBRE JURACI SIQUEIRA na 27ª Feira Pan-Amazônica do livro e das multivozes – Paulo Nunes

 

“O poeta sai da sombra, e
mergulha
no Rio Cajary.
Canoeiro, a cada remada,
veste suas metáforas, assinaladas
de sons e cheiros d'água,
caruanas em fotossíntese.
 
De cajado na mão esquerda
chapéu sobre a cabeça
e muiraquitã no pescoço
o poeta bebe água de chocalho
esfrega orisa na pele
bebe uma cuia de vinho de cupuaçu... em noite de luar;
 
Ele cresceu na frase,
avançou no tempo
e tatuou seu papiro de sonhos
na pele de toda gente
 
O trovador, enfim, metamorfoseou-se
em sons e sinais,
Tramou cardiopoesia,
 abriu o peito,
e distribuiu seu coração aos 4 cantos do mundo”.
(Paulo Nunes, agosto, 18, 2024)
 

 

Antônio Juraci Siqueira, trovador, é um carreador de felicidades, um produtor de metáforas, infestado por sons insinuantes e sonhos insinuantes; mestre de palavras atravessadas de amazonicidade e vida.
Juraci Siqueira é Antônio, é marajoara de Afuá, rio Cajary; é amazônida, um em muitos: açougueiro, oficineiro, filósofo, militante da literatura, editor, professor, “auxiliar de parteira’, declamador de vozes mil e poeta.

Jeová Barros



Em rede nacional, enredado pelo imaginário dos mitos, ele se fez ‘filho do boto’; poeta que pensa em 7 sílabas e escreve na forma dos versos da ibérica medida velha; autor de Travesseiro de Pedras (Falangola Editora), Versos Sacânicos (idem), Pacatatu, Cotia não (Editora PakTatu)... e mais algumas outras dezenas de livros, impressos em off set ou em tiragens artesanais, alternativas, portanto...
Nas décadas de 80 e 90 do século passado, Juraci foi coordenador regional da UBT, e nessa função ele organizou os trovadores para cantar em prosa e verso o Ver-O-Peso, o Círio e outras faces da Amazônia, com o apoio da SEMEC, tendo Bel Fares como “diretora de cultura” e Paes Loureiro como secretário, ele coordenou concursos nacionais de trovas, que resultaram em 3 cadernos de Cultura, que viraram clássicos de nossa literatura.
Atuante, agitador, dos mais assíduos na saudosa livraria da SEMEC, ele reunia em torno de si uma malta de poetas e de trovadores para declamar e animar nossas almas; atenção: se , numa praça houver 2 postes ou 2 árvores com certa distância entre eles, lá vai ele, Juraci Siqueira, montar seu varal de poesia, é quando ele vira o nosso “totrovador”. Uma das experiências mais gratificantes foi quando Josebel Akel Fares, Josse Fares e eu decidimos inclui-lo na segunda e terceira edições do livro Texto e Pretexto: experiência de educação contextualizada de autores amazônicos, livro adotados pela rede municipal de ensino de Belém, SEMEC, e alguns outros colégios, que usavam a coletânea para formar leitores.

Jeová Barros 



Antônio, o Juraci, irrequieto diante das coisas do mundo, resolveu ser editor alternativo de cadernos e libretos de poesia e, nesta modalidade, temos mais de 50 títulos produzidos, pintados e encadernados a mão por ele, seguindo uma tradição iniciada por Eimar Tavares, jornalista, e poeta de quem ele era amigo, autor que Juraci ajudou a divulgar. ‘Totrovador’, nosso poeta integra o Movimento de Contadores de histórias da Amazônia, que tem quase 100 membros espalhados por várias localidades do Pará, Marabá, Castanhal, região  das Ilhas, Bragança, além da capital: Belém.
 Enfeitado com 1 muiraquitã no pescoço, doado, quem sabe, por uma Conory contemporânea, ele é dono de um chapéu Panamá com enfeites marajoaras, este chapéu, dizem alguns, esconde sua marca mítica de boto. Juraci ganhou espaço em rede nacional de TV quando foi entrevistado por Maurício Kubrusly, do Fantástico, da Rede Globo. Foi quando não paravam de chegar telegramas e cartas em sua casa, na Passagem Felicidade, 100, localizada no bairro da Condor; eis que sua vizinhança se viu orgulhosa de seu morador mais ilustre.

Marcos Samuel Costa 



Em suas aparições públicas, emocionadas e emocionantes, o poeta trovador distribui seus corações a leitores e leitoras que se encantam com suas performances. Antonio Juraci configura talvez o único caso de cardiopoesia da literatura brasileira: ele abre o peito e distribui corações poetizados a seus leitores e leitoras.
Creio que o melhor ainda a dizer está no fato de que Antônio Juraci configura um dos ‘poetas paradigma’ da literatura brasileira de expressão amazônica. Um poeta paradigma, para ser classificado como tal, além de ter uma obra fundamental, deve arregimentar em torno de si um número expressivo de escritores e escritoras que passam a tê-lo como referência e o respeitam por sua história literária, por seus ensinamentos, enfim, pelo conjunto de sua obra. Por isto, queridos, queridas e querides,  eu vejo com muita alegria que um poeta como Antônio Juraci, vindo das rinhas do popular, seja (assim como Iracema Oliveira a outra laureada nesta feira de livros e multivozes, representante ilustre dos grupos de folguedos populares) um dos homenageados da 27ª Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes. Congratulo-me com a SECULT e dou:

um hip hip urra!, para Iracema Oliveira e um
hip hip urra! Para Antônio Juraci Siqueira.
E para encerrar minha fala declamo uma trova encantadora de nosso autor:
Numa casinha de palha
Plantada à beira do rio
O nosso amor agasalha,
Dois corações contra o frio (do livro Travesseiro de Pedras, Falangola Editora, 1984)

 

Belém, 18 de agosto de 2024.


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