ENTREVISTA COM ANTONIO MATOS
Entrevista concedida por Antonio Matos para Marcos Samuel Costa, da Revista Variações, em 17 de setembro de 2024.
01 - Antonio, fale-nos um pouco do teu processo de escrita. Além disso, conte-nos também sobre você, quando esta escrita começou e por que começou?
Eu leio muito desde pequeno e comecei a escrever na adolescência. Meu processo sempre foi um pouco caótico: algumas ideias nascem e morrem, enquanto outras me perseguem e vão ganhando forma. Eu deixo essas crescerem até o momento em que preciso botá-las no papel para deixarem de ocupar espaço na minha cabeça. Esse é geralmente o esqueleto. No vácuo onde estava esse esqueleto, começa a crescer um braço deformado, depois uma perna, um pé. Coloco estes no papel também e os pedaços vão se encaixando como uma espécie de monstro de argila. Às vezes, ele sai com uma orelha ou um pé a mais e eu preciso polir a aberração. É um processo longo e cansativo, mas também muito divertido.
02 - Como se manifesta a tua escrita, o que seria uma literatura noir tropical?
O livro é um noir barroco tropical. É a desconstrução do noir, a carnavalização do noir. Dos escombros desse noir clássico, cria-se uma sátira tão violenta quanto a vida, e não menos absurda. É um pêndulo que oscila entre Tânatos e Dionísio. Nesta chave de morte, temos a destruição prevalecendo sobre a redenção. A violência é crua e explícita, tornando o livro visceral em sua natureza e em sua estética. A religião é “chão de fábrica”, retratando a religiosidade das classes mais estigmatizadas. Puta também reza. Os próprios deuses são retratados de maneira trivial e cotidiana. Obsessão, autodestruição e fatalidade permeiam uma narrativa trágica e inevitável. Na chave de vida e de sonho, temos o uso da sátira e da farsa para comentar aspectos sociais, políticos e culturais da sociedade, a introdução do realismo mágico como contraponto anticolonial, o aprofundamento das personagens femininas para além do arquétipo, com histórias próprias que espraiam e povoam o livro para além de, e independente dos personagens masculinos, além da desconstrução do sexo em todo o seu sublime potencial para o ridículo.
03 - Fale sobre seu novo livro, quais percursos te levaram até ele ou como ele chegou até você?
Nasci e vivi no centro de São Paulo, na Rua Augusta, boca do lixo. O livro é um certo olhar para essa realidade. A Augusta sempre foi uma ebulição violenta, de baladas moderninhas a tiroteios em puteiros, bêbados e clínicas clandestinas de bronzeamento e polos culturais com pedintes na porta. É essa dualidade que vivenciei por toda a minha vida e que tento captar no Caso Silva.
04 - Buscas uma escrita que se aproxime do que ou que se afaste do quê?
Ela com certeza se aproxima mais do marginal do que do lírico. Emocionalmente, é um movimento de tensão e distensão entre o trágico e o satírico. É uma escrita rápida. Cortázar disse uma vez que o conto ganha por nocaute e o romance ganha por pontos. Este livro é um nocaute no quinto assalto.
05 - Quais são tuas principais referências no processo do teu O caso Silva - um noir tropical?
São diversas, cada personagem tem uma voz diferente, influenciada por um estilo distinto, que vai de Cormac McCarthy, Nelson Rodrigues, Rubem Fonseca, Juliana Frank, John Fante a Hilda Hilst.
06 - Indicarias uma playlist para esse novo trabalho?
Runnin’ (Extended) - Visioneers
Rodney Yates - David Holmes
Between the bars - Elliot smith
Anemone - The Brian Jonestown Massacre
It Girl - The Brian Jonestown Massacre
Out of Control - She Wants Revenge
Good - Morphine
Makes Me Wanna Die - Tricky
Your life your call - Junip
Without You - Junip
07 - Onde comprar teu livro?
No site da Editora Folheando. E, a partir da semana que vem*, na Amazon.
* Comentário feito pelo escritor antes da publicação da entrevista.
ANTONIO MATOS nasceu em 1984, em São Paulo. É formado em publicidade pela Faculdade Mackenzie e em cinema pela Academia Internacional de Cinema. Roteirista, diretor e escritor, já colaborou com meios como Le Monde Diplomatique e Canal Brasil. Viveu grande parte de sua vida na Rua Augusta, no centro de São Paulo, e seu livro de estreia, O Caso Silva, é inspirado nessas experiências, de onde todas as histórias, incluindo a do golfinho, foram extraídas.
Variações: revista de literatura contemporânea
XII Edição, ano III - lâminas, línguas e Eros
Edição de Bruno Pacífico
2024
Comentários
Postar um comentário