Solução química - conto de marcos samuel costa

 


Solução química

 

Na adolescência eu tentava clarear a minha pele com a água oxigenada e amoníaco, uma solução química que resultava em algo meio espumoso e leve, doía nas feridas que ainda estavam por sarar, abertas e vivas. As minhas colegas da época me diziam que a combinação desses dois produtos e uma tarde de sol poderiam clarear a minha pele, tirariam as manchas, sujeiras. Eu vivia uma terceira ou quarta ou quinta onda de embranquecimento nesse país, justo eu filho de um casal negro, garoto de pele parda, cabelos enrolados, sem entender muito sobre racismo estrutural, eugenia, pensava que clarear a minha pele com aquela química, me tornaria branco, aceitável, mas outra coisa eu me tornava, alguém que odiava a si mesmo, com baixa estima, adoecimento mental, queimei a minha pele, envelheci com sol, tenho hoje marcas, sinais, perto de completar quarenta anos consigo olhar para trás e me perdoar. Foi uma adolescência feliz, mas não clarearia a minha pele no sol das duas horas da tarde novamente. Desaba o planeta Mercúrio nas minhas razões.


Comentários

  1. Marcos Samuel Costa é um dos maiores escritores desse país, e ponto final.

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