Ou náufragos - ficção de Marcos Samuel Costa
Dói
como guerra
Abro a
janela, deixo entrar o vento vindo do Norte, de algum mundo invisível, dos teus
lábios bêbados, junto veio um pedaço oculto de nuvem, dois ou três bilhetes e
um domingo longo, não abro nenhuma. O fogo na cozinha aceso, cozinha arroz
branco com alho, teu perfume de bêbado, a tarde logo acaba, estarás na porta.
Vejo um dos bilhetes em cima da mesa. Uma dor forte no peito e ansiedade no inteiro
corpo. É o som de uma clarineta que vacila. Uma crise de alergia que não me
deixa dormir, fecho a janela e ponho para correr os pássaros que me tocam com
os bicos. Uma lembrança de ti que dói como guerra, me abre como furacão, das
mensagens não respondidas, essa foi a que mais me abalou a realidade das
tardes, baby.
Ou
náufragos
Abalava as
estruturas da casa, “One More Try” de
George Michael estava tocando, quanto tu passaste na mente, na minha pele
rapidamente o odor forte da saudade, salivação mental de prazer outrora.
Pegamos o Jaderlândia ver-o-peso e saímos sem rumo, lembras? O prazer de rodar sem
rumo, de deixar sem rumo os pensamentos, sem rumo o coração, e como náufragos,
deixar a solidão dos dias acompanhar as horas. Mas se tiveres que escolher, o afastamento será o melhor, não sei dormir longe
dos livros, quando começo a trabalhar nos textos fico insuportável. Mas quem é
capaz de aguentar dias após dias dessa loucura da anulação? O medo não me faz
mais tanto temor, meu temor mesmo é ver as rosas imaginárias apagarem-se de
nossos olhos. Há um jardim obscuro em todos nós e em ninguém. Os óculos escuros
na minha cara tapam lágrimas, os óculos escuros nos meus olhos cobrem a
vergonha de não saber te esquecer - neles teu signo....
Desencontro
Algumas coisas são como o destino. Algo
imutável, parada incerta diante das tantas certezas do mundo, a pluralidade de
tudo, resposta na ponta da língua, não a escrita, carvão que range dentro do
coração, como a grama que cresce no campo e continua seu ciclo dentro dos
animais que dela se alimentam. Diante do espelho na escuridão da noite seu
reflexo é algo desumano, diante de si todas as noites, o espelho que ficava
amarrado à parede por um fino fio, queda que poderia ser a salvação nunca
acontecia, balançando-se construía dentro da humana alma, os traumas.
Mas
hoje é dia uno, viagem marcada. Mudança. Chegará ao seu destino novo, deu de
encontro com a soturnidade belenense, múltiplos reflexos.
– Ainda me vejo em vários espelhos, mas em
nenhum me encontro.
– Filho, apaga-se. Marcos Samuel Costa - nasceu em Ponta de Pedras/Marajó e atualmente mora em Belém do Pará. Graduando de Serviço Social/UFPA. É poeta, contista, cronista e romancista. Em 2019 publicou seu primeiro romance “Dentro de um peixe” (ed. Folheando) e tem diversos livros de poemas publicados. E é editor desta revista e do Jornal Crescendo.
curadoria e edição de marcos samuel costa
variações revista de literatura contemporânea
2020
I edição


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Lindeza!
ResponderExcluirAmei!!!
ResponderExcluirMeu amigo Marcos. Maravilhosa essa emoção de caminhar com você na sua inspiração.
ResponderExcluirComo é bom viver essas cenas que se estampam nas nossas emoções. Muito bom chegar aqui hoje neste divino espaço. Abraços!